13 X Camilo Cavalcante

Eu conheci o Camilo numa mostra de vídeos no Museu da Imagem e do Som de Pernambuco, o Mispe, na Rua Aurora, Recife. Naquela noite, a sala Fernando Spencer, instalada a três ou quatro vãos íngremes de escada num casario antigo, exibia os últimos produtos da safra pernambucana da época, se não me engano, isso foi em 1994. Camilo era o projecionista, manuseando uma pilha de fitas VHS,cada uma com um trabalho que seria exibido na TV Philips gorda de 38 polegadas do Mispe. Entre os vídeos que Camilo deu PLAY naquela noite estava Sol Quente de Lascar, de Antônio Souza Leão, e outro, meu, Paz a Esta casa, além de uma dezena de outros trabalhos. Foi nesse dia que vi também pela primeira vez uma criação dele, Cálice. Começava um processo pessoal meu de acompanhamento, filme por filme, das imagens de Camilo Cavalcante, a construção de uma trajetória importante na filmografia recente do cinema pernambucano.

Essa trajetória me chama a atenção pela sua honestidade autoral e uma persistência de visão comum aos autores. Já em Cálice eu percebi uma capacidade de enfrentar a narrativa visual sem grandes formalidades ou medos, fantasma freqüente dos jovens realizadores.

Isso não existia para a naturalidade de câmera de Camilo, que também parecia ignorar a idéia de que “vídeo” deveria conformar-se com uma suposta linguagem própria. Vejam Cálice ou Leviatã, obras inegavelmente eletrônicas na textura da imagem – pré-datando o digital em poucos anos –, mas marcadas por uma liberdade total de movimentos e planos abertos.

Creio que isso que o levou a trafegar por praticamente todos os formatos de captação e realização do audiovisual disponibilizados pela indústria nos últimos 15 anos, reflexo claro da sua fome pelas imagens.

Ver os filmes de Camilo significa voltar à textura do SuperVHS e do Hi8 de Cálice, Os Dois Velhinhos e Leviatã, à dupla “profissional” de vídeo dos anos 80/90 – primeiro o U-Matic, depois a Betacam de SP- de Hambre a Hombre, Matarás e Ave Maria ou Mãe dos Oprimidos,chegando às primeiras experimentações com a película 16mm (Ocaso, Dois Velhinhos), sua ampliação para o 35mm e O Velho o Mar e Lago e A História da Eternidade, e, finalmente, aliando-se ao processo digital mesmo tendo como base o suporte filme (Rapsódia Para um Homem Comum), que o levou ao Super8 numa sequencia experimental-emotiva. Finalmente, em O Presidente dos EUA, agrega ao 35mm o vídeo de alta definição.


http://www.mostralivre.com/ Esse interesse em investigar as muitas imagens do nosso olhar coletivo parece juntar-se a um olhar http://www.mostralivre.com/www.mostralivre.comis temas recorrentes nessa obra:

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1) A identidade cultural dos oprimidos dentro de realidades latino-americanas (Hambre Hombre, A História da Eternidade, Ave Maria, O Presidente dos EUA) e, já numa leitura brasileira, nordestina (Leviatã, Ocaso).
2) A narração apaixonada de crônicas humanas onde sentimentos de amor são exacerbados em imagens de um cinema romântico não só no tom, mas também no que ele há de mais puro (O Velho o Mar e o Lago, Os Dois Velhinhos) e trágico (Rapsódia Para um Homem Comum). È curioso que esse cinema de Camilo, pontuado por planos-sequencia, música e experimento, resulte numa remixagem vigorosa de um dos gêneros mais fortes da latinidade, o melodrama.

A lembrança das fitas VHS naquela noite de vídeos no Mispe e a bela coleção de idéias e imagens reunidas nos filmes de Camilo nos leva a esperar o óbvio: um exercício em longa-metragem onde, seguramente, fragmentos importantes dessa filmografia deverão vir à tona naturalmente com as marcas do seu autor.

Por Kleber Mendonça Filho

Programação do Camilo na MFL - Sessão 1 - Quarta, 24-03 as 17h - Cinema 1 do CCBB

Programação do Camilo na MFL - Sessão 2 - Quarta, 24-03 as 20h - Cinema 1 do CCBB

Debate "Experiências", com Camilo e José Sette - Quinta, 25-03, 20h - Cinema 1 do CCBB

 







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